A IMPERATIVA POSTURA SINDICAL NA DEFESA DO FARMACÊUTICO: POR QUE NÃO DIVULGAR VAGAS DE EMPREGADORES?

Prezados colegas farmacêuticos, dirigentes sindicais e membros da nossa valorosa categoria,

É com a responsabilidade que o cargo de Presidente da Federação Interestadual dos Farmacêuticos (FEIFAR) me confere que venho a público para abordar um tema de suma importância para a dignidade e a valorização profissional: a postura dos nossos sindicatos frente à divulgação de ofertas de trabalho provenientes diretamente de empregadores. Nossa orientação, clara e inequívoca, é para que os sindicatos de farmacêuticos se abstenham de divulgar tais vagas. Esta não é uma medida arbitrária, mas sim uma decisão estratégica e ética, fundamentada na defesa intransigente dos direitos e do bem-estar dos profissionais que representamos.

Vivemos um momento crucial para a categoria farmacêutica no Brasil. A luta por condições de trabalho mais justas e humanas tem ganhado força, culminando no movimento nacional pelo fim da escala 6×1. Esta reivindicação, que busca escalas de trabalho que efetivamente permitam descanso, lazer e uma vida digna para o profissional, ecoa nos corredores do Congresso Nacional e mobiliza a todos nós. É um clamor por respeito, por reconhecimento de que o farmacêutico é um profissional da saúde essencial, cuja exaustão compromete não apenas sua qualidade de vida, mas também a segurança e a qualidade dos serviços prestados à população. A pauta da jornada de trabalho é apenas uma das muitas frentes em que atuamos para garantir que o farmacêutico seja tratado com a dignidade que merece, e é nesse contexto mais amplo de defesa que se insere a nossa posição sobre a divulgação de vagas.

Diariamente, a FEIFAR e os sindicatos filiados recebem um volume alarmante de relatos e denúncias de colegas farmacêuticos que se veem em situações de vulnerabilidade e exploração em seus locais de trabalho. As violações são diversas e, infelizmente, recorrentes. A mais básica delas, o não pagamento do piso salarial da categoria, previsto em Convenção Coletiva de Trabalho, é uma realidade inaceitável para muitos. Soma-se a isso o não pagamento de adicionais que são direitos adquiridos, como horas extras, adicional noturno e adicional de insalubridade, que muitas vezes são simplesmente ignorados pelos empregadores.

A lista de abusos não para por aí. Temos acompanhado de perto casos de acúmulo ou desvio de função, onde o farmacêutico é compelido a executar tarefas que não correspondem à sua formação ou que extrapolam sua carga horária e responsabilidades, sem a devida remuneração. Denúncias de assédio moral e sexual, que corroem a saúde mental e a dignidade dos profissionais, são igualmente preocupantes. A sobrecarga de trabalho, imposta por quadros insuficientes de pessoal ou por metas inatingíveis, leva ao esgotamento físico e emocional. E, para completar o cenário de irregularidades, há ainda os descontos indevidos em contracheques, a falta de registro adequado, a ausência de recolhimentos previdenciários e uma série de outras práticas que configuram flagrante desrespeito à legislação trabalhista e aos acordos coletivos.

Diante deste panorama, a função primordial de uma entidade sindical profissional, como os nossos sindicatos de farmacêuticos, é clara e inegociável: fiscalizar, notificar e denunciar os empregadores que cometem esses abusos. Somos a voz e o braço de defesa da categoria, e nosso compromisso é com a garantia dos direitos e a promoção de um ambiente de trabalho justo e ético para todos os farmacêuticos. Nossa existência se justifica na proteção do trabalhador, na busca incessante por melhores condições e na erradicação de práticas exploratórias.

É precisamente neste ponto que surge a incoerência fundamental na divulgação de vagas por parte dos sindicatos. O sindicato dos farmacêuticos, por sua natureza e atribuições, não possui gerência direta sobre o que acontece dentro dos estabelecimentos empregadores. Não temos o poder de monitorar em tempo real as práticas internas de cada empresa, de garantir que o empregador que oferece uma vaga cumprirá rigorosamente as normas coletivas, a legislação trabalhista ou, mais ainda, que oferecerá um ambiente de trabalho livre de assédio e sobrecarga.

Desta forma, torna-se paradoxal e, em última instância, prejudicial, que uma entidade cuja missão é proteger o trabalhador atue como um canal de recrutamento para empregadores cujas práticas são, na maioria das vezes, desconhecidas ou, pior, já sabidamente problemáticas. Ao divulgar uma vaga, mesmo que com a melhor das intenções, o sindicato pode inadvertidamente conferir um selo de “legitimidade” ou “aprovação” a um empregador que, na prática, pode vir a desrespeitar os direitos do farmacêutico. O que parece ser uma boa intenção – a de ajudar o colega a encontrar um emprego – pode se converter em um endosso tácito a um ambiente de trabalho precário, expondo o profissional a riscos e abusos.

Portanto, a orientação da Federação Interestadual dos Farmacêuticos é categórica: os sindicatos de farmacêuticos não devem divulgar vagas e anúncios de emprego vindos de empregadores. Nossa função não é ser uma agência de empregos, mas sim uma agência de defesa dos direitos. A divulgação de vagas, sem a devida e impossível fiscalização prévia das condições de trabalho, pode ser um desserviço à categoria, minando a confiança dos profissionais na sua própria entidade de classe.

Em vez de divulgar vagas, convidamos os farmacêuticos a se tornarem agentes ativos na defesa de seus próprios direitos e dos direitos de seus colegas. Denunciem! Não se calem diante de abusos, irregularidades ou desrespeitos. O sindicato é o canal legítimo para receber essas denúncias e agir. É fundamental que cada profissional compreenda que sua voz é poderosa e que a união faz a força.

Aos sindicatos, reforçamos o chamado para que intensifiquem suas ações de fiscalização, notificação e denúncia. Sejam proativos na identificação de empregadores que desrespeitam a legislação e os acordos coletivos. Usem todas as ferramentas legais disponíveis para coibir as más práticas e garantir que os direitos dos farmacêuticos sejam plenamente respeitados. A defesa da categoria passa por uma postura firme e vigilante, que não se confunde com a promoção de oportunidades de trabalho sem a devida garantia de dignidade.

Reiteramos que o que parece ser uma boa intenção, ao divulgar uma vaga, pode ser muito prejudicial aos profissionais. E, de certa forma, aqueles que divulgam, mesmo na intenção de ajudar, acabam sendo, de certa forma, coniventes com as práticas de maus empregadores. Nossa missão é proteger, não expor. Nossa força reside na nossa capacidade de lutar por um ambiente de trabalho justo e ético para todos os farmacêuticos. Que cada sindicato seja um bastião de defesa, e não um portal para a precarização.

Com a certeza de que juntos somos mais fortes.

Renato Soares Pires Melo
Presidente

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